Apresentação/Introdução
A chegada do coronavírus impôs uma série de restrições implicando em mudanças radicais nos cotidianos de vida e também nos modos de construir o cuidado nas Redes de Atenção Psicossocial (RAPS), exigindo transformações e criações de novos caminhos de cuidado. Nesse contexto, a equipe do Centro de Convivência e Cultura de Natal -RN (CECCO) passou a investir na manutenção da convivência através de uma plataforma virtual de comunicação: o grupo de Whatts App “CECCO em tempos de Coronavírus”, que posteriormente passou a ser intitulado como “Rádio Bilola” (RB). Foi a partir da criação dessa ferramenta que o CECCO de Natal foi desenvolvendo a sustentação do trabalho e dos vínculos com os usuários do serviço no contexto da pandemia. Como componentes da RAPS, os CECCOS são espaços de sociabilidade, produção cultural e intervenção na cidade, serviços abertos e não exclusivamente voltado às pessoas que usam a RAPS, sendo concebidos também no campo da cultura e não apenas no campo da saúde (BRASIL, 2005). Entendendo que trata-se de uma experiência existosa e que atualmente ainda segue se fortalecendo e ampliando o alcance do serviço na rede de saúde de Natal, apresentamos a Rádio Bilola como estratégia criativa e potente de cuidado em saúde mental e que garantiu o direito aos usuários do serviço, aqui chamados de convivas, ao acesso e a continuidade do cuidado psicossocial mesmo em tempos de pandemia.
Objetivos
Garantir a continuidade do cuidado em saúde mental no contexto exepcional da pandemia da COVID-19. Específicos: 1.Estimular o protagonismo e autonomia dos usários do CECCO de Natal na participação e construção do Grupo de WhattsApp do CECCO – Rádio Bilola. Oferecer um espaço de convívio social virtual para os usuários do CECCO de Nata
Metodologia
Durante a pandemia desenhamos o trabalho a partir das seguintes estratégias: intensificamos o uso do Instagram[Em Instagram: @cecconatal] nos organizamos para realização de contato telefônico semanal para os que não tinham celular e criamos o grupo de WhatsApp “CECCO em tempos de Coronavirus”. Ao compartilharmos mensagens, orientações sanitárias para a prevenção da COVID, vídeos, textos, músicas, ideias, bem como angústias e lembranças, fomos percebendo que ao estimularmos essa conexão entre os convivas, estávamos viabilizando um espaço de socialização e de criação. O convite foi para ocuparmos esse espaço, afirmando a RB como espaço livre e democrático, onde todos nós seriamos locutores e ouvintes, convocando à participação e à construção coletiva do espaço e para fazermos o CECCO acontecer virtualmente. Alguns convivas foram se posicionando e ocupando o grupo com protagonismo, outros ficaram mais como ouvintes e ao chegarem pedidos de ingresso de usuários novos, inventamos o acolhimento virtual. Avaliamos quais atividades poderíamos transportar para o virtual (dança criativa, teatro, oficina de poesia, percussão, meditação) e criamos outras (clube de leitura, dicas de tecnologia, cinedebate, dentre outras) e assim fomos compondo uma rotina de atividades diárias que passaram a ocorrer nos turnos da manhã e da tarde no Grupo, conforme podemos visualizar no cartaz .
Resultados
Com o desenvolvimento da experiência, sentimos a necessidade de criar “Sugestões de Convivência virtual” e para darmos contornos para o funcionamento das oficinas, pactuamos “Combinações para as oficinas virtuais”. Para além das oficinas, que sem dúvida geravam muita conversa e diversas produções, muita intensidade se passava no grupo. O espaço foi sendo ocupado livremente, com protagonismo dos usuários que foram compartilhando notícias e imagens de seu cotidiano, de seus trajetos na cidade, fotos antigas das atividades no CECCO, postando músicas ou áudios cantando, contando causos, relatando lembranças... e assim a RB se afirmou como um espaço de conexão, disponível sempre que o conviva desejasse se comunicar. Um coletivo que escuta o que é falado, que acolhe, e que produz arte e cria mesmo em tempos críticos, parecia fundamental para a manutenção dos vínculos dos convivas com o serviço e entre si, conforme demonstra esse relato: “- Eu perdi uma pessoa essa semana. Ainda bem que tem a rádio bilola, fiquei sem chão. As vezes só quero ficar deitada. Mas vocês me deixam sentir o amor do Universo (...) eu estava muito isolada.” (K., Rádio Bilola, 28/6/2020). A produção realizada no grupo em 2020, primeiro ano de pandemia, resultou ainda na I Mostra Cultural Virtual do CECCO, que pode ser visitada no site: https://cecconatal.wixsite.com/website.
Conclusões
Ao nos depararmos com os desafios impostos ao SUS e à RAPS durante a pandemia, e reconhecendo a ampliação dos riscos da redução da clínica nos modos individualizantes, dado que o distanciamento social passou a ser o modo de vida sanitariamente recomendado, encontramos na ferramenta tecnológica do WhattsApp uma alternativa e a colocamos à serviço do SUS e da Atenção Psicossocial, aproveitando sua ampla difusão junto à população brasileira. Nesse processo percebemos que alguns convivas mobilizaram suas famílias para trocar de celular e aprender a usar o WhattsApp, ampliando o seu acesso ao uso das tecnologias digitais, de forma que podemos pensar a experiência da RB também como estratégia de inclusão digital, para além da estratégia psicossocial. Podemos dizer que nessa experiência de criação da Rádio Bilola foi possível transportar e recriar direções éticas do cuidado na RAPS preconizadas pela Reforma Psiquiátrica para o espaço virtual, como a autonomia e o protagonismo do usuário. Nessa experiência pudemos radicalizar essa direção, ao convocar os convivas para serem os radialistas e protagonizarem oficinas e atividades que antes em sua maioria eram sustentadas pelos trabalhadores.
Palavras-chave
Saúde mental, Centro de convivência, tecnologias .