Apresentação/Introdução
Este projeto se fundamenta na necessidade de se levar a assistência de crianças enlutadas em decorrência da morte repentina de um ou mais familiares próximos, no contexto pandêmico da Covid-19. Algumas razões que principiaram tal abordagem mostram que além do sofrimento individual vivenciado por essas, existia-se também um agravante (medo) que era constante sobre sua própria morte, bem como de seus familiares e suas consequências. Levando, portanto, o serviço de saúde pública do Município de João Câmara/RN a refletir acerca de possibilidades de intervenção capazes de abranger um maior número de crianças. Dessa forma, as psicólogas Ana Paula Teixeira e Mercely Souza, ambas da Secretaria Municipal de Saúde integrantes da Equipe Multidisciplinar, do Município de João Câmara-RN, fundaram e puseram em prática o grupo psicoterapêutico denominado “Entrelaços” que contou, também, com a participação da psicóloga, Larissa Vilar, do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS-II). O grupo abordou ludicamente pensamentos e emoções suscitados pela perda. Bem como, disponibilizou o espaço de fala coletiva e individual para seus integrantes e direcionamentos aos familiares para que pudessem auxiliar nesse processo de maneira mais saudável. Fizeram parte da composição desse grupo: 10 (dez) crianças de 5 a 10 anos de idade, todas com alguma perda durante o período pandêmico da Covid-19 entre 2020 a 2021.
Objetivos
Prestar assistência psicológica no luto de crianças que se depararam com a morte repentina e recente de um ou mais familiares próximos, no período pandêmico da Covid-19, com intuito de desenvolver a consciência emocional e apresentar estratégias para conhecer e gerenciar seus pensamentos e emoções dentro do luto. Proporcionar aos familiares habilidades para lidar com as formas subjetivas que cada criança manifesta nesse difícil momento de perda. Objetivos específicos: Mediante necessidade, buscar-se-á através deste trabalho: Acrescentar esforços para que um maior número de crianças do serviço público possam ter acesso necessário e cuidado com a saúde mental no momento tão delicado de perda familiar; Reduzir os impactos gerados na saúde mental destas crianças; Propiciar a redução dos casos de luto mal elaborados no município.
Metodologia
Este trabalho trata-se de um relato de experiência em um grupo psicoterapêutico, criado com base em pesquisas teóricas e bibliográficas onde foram feitas coletas de dados a partir de artigos, livros e revistas científicas para utilizá-las como alicerce das seguintes temáticas abordadas: luto infantil, perda repentina de genitores, intervenção psicológica em situação de emergência e impactos na saúde mental após perda familiar no período pandêmico da Covid-19. Ainda nesse contexto, também foram utilizados nas intervenções, recursos lúdicos de suma importância, como: O filme “Up Altas aventuras”, O livro “O monstro das cores” e “Pote da calma”, bem como desenhos livres, dinâmica de balões, Jogo das emoções com cartas, dinâmica de bexigas “qual seu maior medo?” para o monitoramento das emoções e sentimentos das crianças. Neste ínterim, salienta-se também que os encontros foram divididos entre: Planejamento, anamnese com responsáveis, assim como entrevistas devolutivas e encontros com crianças do projeto. Totalizando em 10 (dez) encontros.
Resultados
A realização do grupo se deu inicialmente com 10 participantes, estando todos cientes da perda de seus entes queridos, assim como dos seus motivos. Ressalta-se também que estas crianças receberam algum tipo de suporte ou apoio familiar durante as intervenções. Participaram até o fim do processo, nove crianças. Entretanto, apenas uma não conseguiu permanecer a partir do segundo encontro, pois a mesma apresentou dificuldades em se separar da sua avó materna, já que essa no momento, estava sendo sua principal figura de amparo e proteção. Assim, viu-se que essa foi uma das maiores dificuldades encontradas na maioria das crianças. Isso se intensificava sob a possibilidade real de novas perdas pela Covid-19. Os que persistiram até o fim dos encontros conseguiram, aos poucos, desprender-se dos familiares, com estratégias de distanciamento contínuo e orientado. Os sintomas ansiosos suscitados no início também estiveram presentes durante os encontros iniciais. Ao longo desses, os mesmos foram abordados e apresentaram redução nos indicativos. Quanto ao diálogo sobre como lidavam relativamente com o contexto da morte, todos conseguiram se expressar verbalmente através das atividades lúdicas. Desse modo, foi possível acessar como resultado, o conteúdo do sofrimento dos participantes. Assim, durante todos os encontros foram apresentadas estratégias para identificar e lidar com sentimentos, emoções e pensamentos. Do mesmo modo, foram dadas orientações individuais aos familiares.
Conclusões
Em virtude dos fatos expostos, fez-se imprescindível a atuação do grupo “Entrelaços” como estratégia em saúde mental, que pudessem dar voz ao sofrimento infantil, dessas que se encontravam enlutadas por mortes repentinas de figuras tão importantes. Crianças essas que não puderam ser, muitas vezes, assistidas em outras modalidades de atendimento, sequer pelas ferramentas digitais, naquele momento. Tendo elas que respeitar restrições e cuidados necessários para evitar possíveis contaminações. Deste modo, dos nove participantes, quatro precisaram dar continuidade ao atendimento individualizado, já os outros cinco, conseguiram amenizar os impactos sofridos. Resultando para aquele momento a eficácia necessária das intervenções. Sendo portanto, possível constatar também a necessidade de maior tempo de duração e mais encontros para o grupo supramencionado, tendo em vista a intenção da suavização desse processo que pode ser tão doloroso e até mesmo acarretar situações danosas a longo prazo. Portanto, o grupo não tira a necessidade de se olhar o indivíduo dentro do seu sofrimento particular, ao contrário o legitima e dá voz aos iguais. Estabelecendo entre laços afetuosos, que juntos unem suas dores.
Palavras-chave
Luto infantil, Covid-19, grupo psicoterapêutico.