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Francisco Morato - SP

Reportagem especial: projeto direciona ações de prevenção às DSTs para jovens pretos e pardos em Francisco Morato-SP


27/03/2024 15h29



Muitas doenças sexualmente transmissíveis poderiam ser evitadas com a ampliação do acesso à informação, sobretudo para pessoas em situação de vulnerabilidade. No estado de São Paulo, segundo o Ministério da Saúde, pessoas brancas e com mais escolaridade recebem mais informação e, consequentemente, utilizam mais os serviços de saúde, quando comparadas à população parda e preta.

Para reverter esse quadro, o Centro de Referência e Treinamento DST/AIDS do Estado de São Paulo (CRT/SP), da Coordenadoria de Controle de Doenças (CCD-SES), desenvolveu em 2022 o Projeto Partiu Prev Perifa, com o objetivo de realizar um trabalho preventivo nas áreas mais remotas das cidades. O primeiro município a aderir à proposta foi Francisco Morato, que passou a desenvolver ações, a cada dois meses, nas áreas periféricas de maior circulação de jovens.

Um dos principais mecanismos de prevenção ao HIV é a PrEP (Profilaxia Pré-Exposição), através da ingestão diária de comprimidos que preparam o organismo para enfrentar um possível contato com o vírus. A medicação pode impedir que o vírus se estabeleça e se espalhe no corpo, mesmo tendo uma relação sexual de risco. Apesar da importância do tratamento, muitos municípios paulistas não disponibilizam o serviço de forma generalizada. Em São Paulo, 62,9% dos brancos têm acesso à PrEP, enquanto somente 10,7% dos pretos e 24,7% dos pardos são beneficiados pelo tratamento.

Em Francisco Morato, para diminuir a distância entre brancos e pretos no que se refere a esses serviços, o trabalho é geralmente realizado na rua, com a concordância da comunidade, e reúne 15 profissionais que fazem acolhimento e aconselhamento. Os agentes comunitários de saúde ajudam a identificar áreas com maior concentração de jovens pretos e pardos, com baixa escolaridade e pouco acesso à informação sobre Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs).



Em 2022, foram feitas quatro ações do projeto, beneficiando 134 pessoas. A equipe realizou 536 testes rápidos, distribuiu mais de 5.000 preservativos externos, 200 preservativos internos e possibilitou a Profilaxia pré-exposição ao HIV. A primeira ação ocorreu no "Baile do Santa", uma festa funk onde jovens da periferia se reúnem até o amanhecer. "Mapeamos com os ACS os pontos com aglomeração de pessoas vulneráveis. Um dos profissionais identificou esse baile funk de rua, em local afastado onde circulam bebidas e drogas, e conversamos com a comunidade", conta Angela Alencar de Lima, farmacêutica e coordenadora do Programa Municipal de Infecções Sexualmente Transmissíveis, HIV/aids e hepatites virais.

Em cada ação são realizados teste rápido para HIV, Sífilis, Hepatite B e C, profilaxia pré e pós exposição ao HIV, distribuição de pílula do dia seguinte para evitar gravidez, de anticoncepcional, de preservativo interno e externo, de gel lubrificante e realização de autoteste de HIV.

Presença comunitária

Como as abordagens são realizadas geralmente em áreas de risco, a participação da comunidade tem sido fundamental para intermediar a relação entre os profissionais de saúde e os jovens. "Nós sempre articulamos antes com a organização dos eventos porque em alguns lugares é difícil até adentrar. Os organizadores nos permitem transitar no meio da galera para conversar e a comunidade também nos ajuda, possibilitando a utilização de energia elétrica para iluminar nossas tendas e disponibilizando banheiros", conta a coordenadora.

As tendas são montadas nas ruas que dão acesso aos bailes para abordar a juventude antes de chegar à festa. Os agentes conversam, fazem teste rápido, oferecem preservativo e falam sobre a profilaxia. Ângela relata que em uma das festas, o proprietário pediu senha de quem fez o teste e ofereceu como recompensa a entrada gratuita. 

Os profissionais usam diferentes estratégias para mapear zonas de maior risco. A partir da identificação de um casal que testou positivo para HIV, se chegou a um bar, frequentado por pessoas acima de 40 anos, onde foi identificada mais uma pessoa contaminada pelo vírus, o que levou à intensificação do trabalho preventivo no local. As abordagens de rua visam atrair cada vez mais a população aos serviços de referência e às próprias Unidades Básicas de Saúde. 

O casamento de Ana (nome fictício) chegou ao fim quando ela descobriu que estava sendo traída pelo marido. Preocupada com uma possível exposição a doenças sexualmente transmissíveis, ela procurou o Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) do município. Constatada a presença de uma DST, a doença foi tratada em tempo oportuno e com a oferta de acompanhamento psicológico. 

"Fiz a triagem, tudo muito discreto, rápido e acolhedor, e com o resultado positivo fui agendada para o exame de sangue, encaminhada para consulta com o especialista e no mesmo instante comecei o tratamento medicamentoso. Em 15 dias o tratamento já tinha dado o efeito desejado. Nunca pensei que houvesse um serviço do SUS com esse grau de excelência. Indico para todo mundo", elogia a agente penitenciária.

Nas abordagens externas, foram identificados muitos casos positivos de Sífilis (8%), mas a equipe conseguiu uma boa adesão ao tratamento, o que permitiu interromper a cadeia de transmissão. "Antes das ações, jovens pretos com ensino fundamental não chegavam aos serviços. Hoje vemos pessoas com vulnerabilidade, profissionais do sexo, buscando os métodos preventivos. Com a disseminação das informações, os jovens estão procurando os postos de saúde para realizar o teste ou fazer a Prep, que antes só era realizada no Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA)", comemora a coordenadora.

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