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Rio Preto da Eva - AM

Entrega de cartas-convite para pacientes do SUS amplia rastreamento do câncer do colo do útero


15/05/2025 17h18

Por Giovana de Paula

No Brasil, o câncer do colo do útero ocupa a terceira posição entre os tipos de neoplasias mais comuns em mulheres. Segundo estimativas do Instituto Nacional de Câncer (Inca), são esperados aproximadamente 17.010 novos casos para cada ano do triênio 2023-2025, o que representa uma taxa bruta de incidência de 15,38 casos por 100 mil mulheres. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), entretanto, é possível reduzir entre 60% a 90% os casos quando pelo menos 80% da população feminina é contemplada por ações de rastreamento, como a realização de exame citopatológico. Para ampliar o diagnóstico precoce e o tratamento adequado, uma iniciativa na cidade amazonense de Rio Preto da Eva mobilizou pacientes do SUS a partir da entrega de cartas-convite nomeadas.

Situado na Região Metropolitana de Manaus, o município de Rio Preto da Eva contava com 24.936 habitantes em 2024, sendo 12.078 mulheres. Dessas, 5.800 estão dentro da faixa etária de 25 a 64 anos, público-alvo para a coleta anual do exame  preventivo, conforme o Ministério da Saúde. O preventivo, também conhecido como exame de Papanicolau, tem sido historicamente usado para a detecção precoce do câncer— mas a vigilância epidemiológica evidenciou que muitas pessoas com útero não  realizavam a coleta na rede pública há pelo menos três anos.

Com o objetivo de sensibilizar a população sobre a importância da testagem periódica, a enfermeira Andreza Cezar Fonseca criou um projeto nos bairros onde atua, Monte Castelo I e II e Morada do Sol. No território, 277 das 847 mulheres cadastradas na Unidade Básica de Saúde Ednaide Lopes da Costa estavam com exames atrasados. “Já tínhamos tentado de tudo: palestras, ações de conscientização, sorteio de brindes, sorteio de valores em dinheiro... Usamos várias estratégias para tentar alcançar esse público. Mas nada funcionava. Foi então que eu pensei: ‘O que mais posso fazer?’. E aí veio a ideia da cartinha”, relata a profissional. A iniciativa aconteceu em 2024.

A partir de dados registrados no ESUS Helper, plug-in criado para ajudar municípios a melhorarem seus Indicadores do Previne Brasil, a equipe da UBS identificou os nomes de cada uma das 277 usuárias. Foram elaboradas, então, cartas-convite personalizadas, com linguagem simples e laço de fita, entregues exclusivamente à mulher destinatária. “Elaborei a cartinha da forma mais simples possível, para que todas pudessem entender o verdadeiro objetivo daquelas palavras. Queria que elas entendessem o motivo de realizar a coleta. Na cartinha, eu explicava um pouco sobre a doença, como era feito o exame, a periodicidade recomendada… Meu objetivo era tocar o coração delas. Eu queria que, ao abrirem aquela cartinha e lerem o conteúdo, pensassem: ‘Poxa, eu preciso me cuidar’. Meu objetivo era sensibilizá-las pelo cérebro e pelo coração. Para atingir a mente, incluí informações; para chegar no coração, coloquei um lacinho”, explica Andreza.

Os Agentes Comunitários de Saúde (ACS) foram fundamentais para o sucesso do projeto: responsáveis pela entrega das cartas-convite, os profissionais realizaram o papel de mobilização ativa, inclusive lendo em voz alta o conteúdo para mulheres analfabetas ou com dificuldades na leitura. “Já nos primeiros dias, logo após a entrega das cartas, as mulheres começaram a aparecer na unidade com a cartinha na mão para coletar o preventivo”. A equipe da UBS, engajada no projeto, recebia as usuárias de forma acolhedora.

A implementação da estratégia resultou em um aumento significativo na adesão das mulheres à coleta do exame preventivo do câncer do colo do útero. Entre 10 de janeiro e 09 de abril de 2024, foram realizadas 189 coletas, alcançando uma taxa de adesão de 68,5%. Em comparação com o mesmo período do ano anterior, 2023, houve um aumento de 61 exames. Dos preventivos realizados, 39 resultados foram entregues até a conclusão do projeto, sendo identificadas 4 alterações citológicas: dois casos de ASC-US (Células Escamosas Atípicas de Significado Indeterminado) e dois casos de ASC-H (Células Escamosas Atípicas de Significado Indeterminado, sem exclusão de lesão de alto grau).O desempenho do município no Indicador 05 do Previne Brasil alcançou 59,2%, superando pela primeira vez a marca de 50%.

Agente Comunitário de Saúde na territorialização

Profissionais que integram a equipe dos serviços de Atenção Básica, os Agentes Comunitários de Saúde atuam diretamente nos territórios, com visitas domiciliares ou comunitárias, individuais ou coletivas. Tarcísio de Aragão, ACS de Rio Preto da Eva, atuou na consolidação do projeto: “(A enfermeira) Andreza escreveu um texto muito bonito e chamou cada agente para fazer essa busca ativa do preventivo. E  deu muito certo! Foi um sucesso, porque a carta foi bem aceita, principalmente na minha área”, celebra.

“Eu chegava até a residência, batia palma, a comunitária me recebia muito bem e eu entregava a cartinha pra ela, explicando que ‘isso é uma cartinha que chegou pra você, exclusivamente, especialmente pra você’. A cada entrega que eu fazia, a mulher olhava pra mim e se sentia muito importante: ‘Poxa! O Agente Comunitário de Saúde chegou até a minha casa, ao meu domicílio, trouxe uma cartinha me convidando pra ir até a UBS fazer o preventivo!’. Um simples exame pode salvar muitas vidas”, relembra.

Para Tarcísio, o projeto qualificou também o trabalho dos ACS. “E detalhe: tinha comunitária minha que não sabia ler, mas ela pedia pra eu ler, pra ela ver o que era. Elas se emocionavam com aquela cartinha e acabavam indo até a UBS. Esse projeto foi de total relevância para a nossa profissão”, finaliza.