“Matriciamento ou apoio matricial é um novo modo de produzir saúde em que duas ou mais equipes, num processo de construção compartilhada, criam uma proposta de intervenção pedagógico-terapêutica”. Esta é a definição técnica do Guia Prático de Matriciamento em Saúde Mental, publicação do Ministério da Saúde de 2011. Em Araucária, no Paraná, o conceito fica visível na prática. Desde 2019, o matriciamento, antes restrito às Unidades Básicas de Saúde (UBS), passou a ser realizado nas Unidades de Pronto Atendimento (UPA) a fim de agregar conhecimento para as equipes, esforço multidisciplinar e um olhar diferenciado para a saúde mental.

Com foco em acolher usuários com transtorno mental e/ou uso de substâncias psicoativas, a intervenção pedagógico-terapêutica proporciona maior precisão nos tratamentos, além de redução na sobrecarga do serviço e, por consequência, melhor aproveitamento dos recursos. Para o médico psiquiatra André Luiz Basso, 30, esse tipo de acolhimento ainda é uma dificuldade em todo o país. “O paciente chega na UPA e o clínico não sabe manejar. A própria equipe acaba destratando o paciente, mas tem sofrimento psíquico ali”, pontua.

André atuou como médico em Araucária por dois anos e seis meses e conta que o desafio não está só no primeiro contato com o paciente, mas na continuidade do tratamento. “A gente percebia que o paciente caía na UPA, era estabilizado clinicamente e recebia alta, mas não tinha acompanhamento. Então nossa ideia com o matriciamento é que o paciente seja atendido na emergência, mas tenha garantia do serviço especializado”, completa o psiquiatra.

Na prática, o matriciamento fez com que os médicos passassem a realizar visitas periódicas para dialogar com a equipe de plantão e discutir os casos envolvendo saúde mental. A análise é feita caso a caso, com base em informações como motivo da internação, anamnese, exame do estado físico e mental, histórico clínico e psiquiátrico, além de medicações em uso e evolução.

“O matriciamento foi se modelando na realidade da UPA com dois encontros semanais e o sucesso na implantação também se deve ao perfil e interesse dos médicos matriciadores, que assumiram essa responsabilidade”, conta a assistente social Nouey Staldiff Lourenço Vieira, que atua na rede de saúde de Araucária.

Conforme conta, os resultados na assistência e acolhimento dos pacientes foram positivos. “Houve uma diminuição do tempo de internamento na UPA, pois com o ajuste de medicação o paciente estabiliza mais rápido. A situação também é melhor descrita na solicitação de leito hospitalar, facilitando seu aceite no hospital. Tivemos melhora no acolhimento do paciente e condutas mais assertivas”, enfatiza a assistente social. Ao mesmo tempo, ela destaca, todo o processo é discutido junto às famílias, tornando-as corresponsáveis pela continuidade do tratamento e, em casos que não há vinculação familiar, busca-se suporte na rede socioassistencial.

Educação em Saúde

Há pouco mais de quatro anos atuando na Unidade de Pronto Atendimento, a assistente social relata que antes do matriciamento desconhecia o território e os equipamentos disponíveis no município, os fluxos da saúde, o manejo com pacientes psiquiátricos e até mesmo os termos utilizados pela equipe médica e de enfermagem.

“Eu, sendo assistente social, não tive uma formação acadêmica específica da saúde, muito menos em relação aos pacientes psiquiátricos, tampouco minha experiência profissional condizia com a realidade da UPA. Foi o matriciamento que possibilitou essa vivência, guiando o que é necessário ser observado e quais as condutas mais assertivas”, avalia a assistente.

Após alguns meses participando da intervenção terapêutica, não só Nouey, mas diversos outros profissionais relataram que se sentiram mais seguros na conduta com os pacientes psiquiátricos. Isso porque, como ferramenta clínica e pedagógica, o matriciamento age para fortalecer não somente o trato com o paciente, mas o próprio diálogo entre profissionais e rede de serviços.