26/08/2022
Previne Brasil é discutido durante o Seminário “Financiamento da Atenção Primária à Saúde”
26/08/2022 08h45 - Atualizada em 26/08/2022 08h45
Diversos assuntos que perpassam o financiamento da Atenção Primária à Saúde, no Brasil e no mundo, foram abordados durante o dia de programação do seminário realizado pelo Conasems em parceria com o Banco Mundial. Na parte da manhã, com a presença de convidadas internacionais, a temática foi debatida de maneira macro, com a apresentação de experiências e cenários de outros países (Confira aqui a reportagem), na parte da tarde, o seminário focou o debate em temas mais específicos, como o Programa Previne Brasil.
Mesa – Financiamento e o Programa Previne Brasil
Hisham Hamida, diretor do Conasems, fez uma ampla apresentação sobre o histórico, cenário atual e perspectivas do financiamento do SUS em relação à Atenção Básica, resgatando a Política Nacional da Atenção Básica e a criação do Previne Brasil. “Ressalto aqui a importância de pensar o Brasil como um todo, porém levando em consideração a heterogeneidade dos municípios e, principalmente, daqueles que compõem a amazônia legal, que têm condições diferentes de logística e dos processos de trabalho para ações relacionadas à assistência”.
Em relação a força de trabalho na AB, Hisham destacou que, após o arrefecimento da pandemia, os serviços foram retomados, somando cerca de um milhão de procedimentos em 2021, dentre esses serviços estão atendimentos odontológicos, visitas domiciliares, procedimentos, etc. “Até abril de 2022, já contabilizamos mais de 413 mil atendimentos realizados e, seguindo essa tendência, esse número vai aumentar e ultrapassar os anos anteriores, mostrando a força e a capilaridade que o SUS tem nos municípios. Acredito que esses números comprovam que já estamos trabalhando na ampliação e o foco tem que ser, também, na qualificação”.
Hisham Hamida, diretor do Conasems
O diretor do Conasems ressaltou a criação do Previne Brasil, programa que foi pensado de maneira tripartite e com fortes colaborações do Conasems. “A criação da SAPS foi importante para validar esse movimento e outras ações que somaram a isso, como a expansão do valor cofinanciamento Federal para a AB de maneira progressiva, estabelecido dentro do Previne, além da definição de não haver retrocesso financeiro para os municípios, que foi um pleito do Conasems”.
Hisham também enfatizou a importância do cadastramento dos usuários no âmbito das mudanças para o financiamento do SUS. “Desde então, alcançamos cerca de 170 milhões de brasileiros cadastrados e sem isso acredito que não é possível realizar ações com eficiência, a equipe precisa conhecer seu território, seus usuários, realizar estratificação de risco… e a partir disso planejar e executar as ações na AB”
Roberto Tapia Hidalgo, Coordenador da Unidade Técnica de Capacidades Humanas da Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) Brasil, falou sobre a necessidade de pensar os indicadores, levando em consideração as realidades. “É necessário melhorar os indicadores, levando em consideração a realidade dos locais, municípios rurais, urbanos… nunca um conjunto de indicadores vai abranger todas as realidades, é preciso que isso seja levado em consideração, e é um desafio para o Brasil”.
Roberto Tapia Hidalgo, Coordenador da Unidade Técnica de Capacidades Humanas da Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS)
Tapia também falou sobre a camada política e de governança que sobressai a camada técnica quando o assunto é financiamento de uma política pública. “Pensar o financiamento da atenção primária é fundamental para avançar. Análises como da Lancet, por exemplo, apresentadas neste seminário, são importantes para desenhar caminhos, porém, questões políticas e de governança específicas de cada país também precisam estar presentes nessas análises. A camada técnica é importante, mas existem outras camadas que compõem o todo”
O representante da OPAS, também destacou a valorização dos recursos humanos na área da saúde. “Com a pandemia ficou ainda mais evidente questões relacionadas à jornada de trabalho dos profissionais, foi iniciado com mais evidência debates sobre burnout, estresse no trabalho e sobrecarga viraram pauta de discussões no mundo todo”.
Mesa – A Implementação do Programa Previne Brasil
Cristiane Martins Pantaleão, Vice-Presidente do Conasems, ressaltou a importância da escuta dos gestores que atuam na ponta, principalmente no momento de traçar estratégias. “Desde 2015, quando iniciamos a reformulação da PNAB, o Conasems percorreu o Brasil em um processo de escuta e agora retomamos essa jornada nos municípios de todas as regiões. É de grande importância ouvir o que eles têm a dizer em relação às necessidade da população, das demandas, as sugestões… cada vez mais enfatizamos a importância da escuta”. Segundo Pantaleão, colocar a Atenção Primária em prática é extremamente complexo. “Sem dúvidas, é importante aumentar a eficiência, mas destaco a importância de aumentar os recursos, porque uma coisa está atrelada a outra.”
Edson Araújo, Economista Sênior, Banco Mundial, apresentou o relatório que analisa resultados obtidos no primeiro ano de implantação do Previne Brasil. “No relatório buscamos avaliar alguns aspectos qualitativos e quantitativos. O que se destaca a princípio é o cadastramento dos usuários que, sem dúvidas, foi um trabalho que gerou ótimos resultados, com um incremento no primeiro ano de mais de 80%”. De acordo com Araújo, o relatório comprova que a grande maioria dos municípios já gasta mais de 15% de recursos próprios em saúde. “Isso é bem mais que o mínimo obrigatório estabelecido na constituição, ou seja, temos aí comprovadamente um desafio fiscal imenso em relação ao âmbito municipal”.
Edson Araújo, Economista Sênior, Banco Mundial,
O economista do Banco Mundial afirmou que o Programa Previne Brasil se conforma como uma evolução do mecanismo de transferências federais que incentiva o aumento da cobertura (cadastro) na APS, principalmente entre as populações vulneráveis, com foco nos resultados de saúde da população (desempenho da APS). Segundo ele, “a implementação do Previne resultou na redistribuição dos recursos federais destinados ao financiamento da APS no SUS”.
Segundo a análise, registou-se, entre os anos de 2019 e 2020, aumento no volume dos recursos federais para 55% dos municípios brasileiros no âmbito do Programa com uma taxa média de crescimento que varia de 13,6%, entre todos os municípios, e de 25,2%, entre as capitais. Além disso, o Programa superou as metas estabelecidas durante uma pandemia de escala global. “o aumento expressivo do cadastro, e as consequências de médio e longo prazos de permitir acompanhamento dos usuários cadastrados pelas eSF, é um marco no financiamento e na organização da atenção à saúde dentro do SUS. Essas mudanças seguem as melhores práticas internacionais como apontado no relatório da “Comissão do Lancet para Financiamento da Atenção Primária à Saúde”
Ainda nas palavras de Araújo, “os esforços feitos pelos gestores municipais para ampliar o cadastro e acompanhar as metas do pagamento por desempenho indicam como as mudanças introduzidas pelo Previne mudaram o paradigma da gestão do SUS em todas as regiões do país.” O relatório registrou ganhos reais e entre os palestrantes o Programa está sendo considerado como possíveis caminhos a serem seguidos por sistemas de outros países em desenvolvimento.
Comentários
Ao final do seminário, especialistas convidados fizeram comentários relevantes sobre a temática debatida no evento. Os comentaristas foram: Raphael Câmara Medeiros Parente, Secretário de Atenção Primária à Saúde – Ministério da Saúde (SAPS/MS); Maria José Oliveira Evangelista, Assessora Técnica do CONASS; Diogo Demarchi Silva, Assessor do CONASEMS e Mauro Guimarães, Secretário Executivo do CONASEMS (todos os comentários podem ser assistidos na íntegra acessando o vídeo do evento)
Confira alguns trechos dos comentários feitos por Natalia Nunes, Economista da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE) e Pesquisadora do Grupo Global de Economia e Economia da saúde da Universidade de York, Inglaterra:
“Agradeço convite, e estou basicamente aprendendo, é muito rico esse tipo de evento para nós que somos do meio acadêmico. Quando fui ao lançamento do Previne, como acadêmica eu duvidei que em 1 ano iriam conseguir avançar com o programa. A academia tem também uma função de analisar e fazer perguntas. Sempre temos uma posição de dúvidas e querendo observar o que os dados nos mostram. Bem os dados começaram a sair. Primeiro da Importância da transição, enquanto observa que captação aumentou e que o financiamento está aumentando, e estamos ainda em momento de transição.”
“Não dá para se fazer análise de impacto, ainda é cedo, no entanto precisamos mais tempo e ainda há a transição para novo modelo. Eu particularmente tenho um olhar especifico e muito focado nas grandes cidades, nas regiões metropolitanas, pois o meu pensamento é para se ter uma cobertura universal, é necessário inserir e ampliar os registros e não poderá fazer essa transição sem cidades grandes. Se não aumentar a captação e cobertura nos grandes centros, não teremos um salto de cobertura universal. Então as cidades mais povoadas, devem ser a virada de chave para que essa cobertura seja considerada universal.”
“Parabenizo a todos os gestores pelo trabalho em implementar o previne. Nas grandes cidades existe uma dificuldade de interpretação e relação com o conceito de território. O tamanho do desafio não é somente para a gestão e sim para a população. Estamos em período de mudanças e os gestores são fatores chave. Temos várias análises que podem ser realizadas considerando os demais componentes. Os municípios que possuem uma cobertura muito boa outras estratégias devem ser consideradas para ampliar os recursos, a autonomia e a necessidade de saúde local será definitiva. Será necessário a qualificação dos profissionais , assim como formação dos médicos e dos demais profissionais de saúde. Vivemos em um país muito heterogêneo. É uma mudança grande em vários níveis a ponto de chegar na população”.
Natalia Nunes, Economista da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE) e Pesquisadora do Grupo Global de Economia e Economia da saúde da Universidade de York, Inglaterra
Confira o vídeo do seminário com a programação da parte da tarde:
O Seminário Financiamento da Atenção Primária à Saúde no Sistema Único de Saúde contou com a participação da Dra. Kara Hanson, coordenadora da The Lancet Global Health Commission sobre o financiamento da Atenção Primária à Saúde: colocando as pessoas no centro. A Comissão apresenta novas evidências sobre níveis e padrões de gastos globais em APS; analisa os principais desafios técnicos e de economia política; identifica áreas de prática comprovada ou promissora; e sugere políticas acionáveis para apoiar os países de baixa e média renda na captação, alocação e canalização de recursos para apoiar a prestação de APS eficaz, eficiente e equitativa.
Acesse publicações em português da The Lancet Global Health Commission sobre o financiamento da Atenção Primária à Saúde:
Financiamento da assistência primária à saúde – priorizando as pessoas
Mobilização e consórcio de fundos para a saúde
Alocação de recursos para a assistência primária à saúde
Obtendo incentivos diretos para a assistência primária à saúde
Acesse relatório completo em inglês em: